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Governança nas estatais: como aperfeiçoar a seleção dos gestores?

Diego Valois e Rafael Hamze Issa são advogados e associados-fundadores do Instituto Brasileiro de Direito e Ética Empresarial (IBDEE). 

Os últimos acontecimentos noticiados na mídia envolvendo indícios de corrupção praticados por dirigentes de empresas controladas pelo Estado corroboram a necessidade de aprofundamento e aplicação rigorosa das diretrizes de governança corporativa.

O avanço da Operação Lava-Jato, que na sua fase “Radioatividade” passou a investigar indícios de corrupção em contratos celebrados com a estatal Eletronuclear, evidencia que falhas no atual modelo de gestão das empresas estatais não são exclusividade da Petrobras – fato que, de resto, não significa qualquer novidade. Na sequência destes eventos, tem sido possível observar que boa parte dos investigados nos supostos esquemas de corrupção ocupavam posições de destaque na administração das empresas, notadamente como membros de diretoria. Deste contexto, sobressai-se a necessidade de refletir sobre as práticas adotadas pelas empresas estatais para a seleção dos gestores públicos, bem como se tais práticas estão de acordo com as melhores condutas da governança corporativa.

Sem maiores aprofundamentos, sabe-se que a empresa estatal, expressão genérica para designar a sociedade de economia mista e a empresa pública, desenvolve atividade empreendedora em nome do Estado, seja para executar serviço público, seja para explorar atividade econômica em sentido estrito. Para cumprir esse mister com padrões condizentes de eficiência, compatíveis com aqueles observáveis na iniciativa privada, torna-se necessário que a designação dos seus gestores, aqueles que ocuparão assentos no Conselho de Administração e na Diretoria, seja feita conforme critérios de qualificação técnica, independência funcional, entre outros adequados à realidade da empresa.

É dizer, segundo as melhores práticas em governança corporativa, que a diretriz maior que deve nortear a escolha do dirigente deve ser lastreada no estrito interesse da empresa estatal, de modo que a gestão administrativa seja executada na finalidade de majorar o valor do ativo público e, por via de consequência, da poupança pública, representada na pessoa do acionista.

Neste sentido, o Programa de Governança das Estatais, documento elaborado pela BM&FBovespa com o propósito de fomentar práticas de governança corporativa nas estatais, dedica todo seu Capítulo Terceiro para tratar sobre a Composição da Administração e Conselho Fiscal. Da análise do referido capítulo, observa-se que não foi intenção da BM&FBovespa esgotar a priori os requisitos a serem indicados pela companhia para fins de escolha do dirigente — o que andou bem neste sentido, pois permite que cada empresa possa elaborar sua política de indicação de acordo com as suas particularidades.

Embora seja possível inferir certa autonomia para formulação da política de composição da administração, como noticiado acima, deve-se registrar que o documento elaborado pela BM&FBovespa regula objetivamente uma série de relevantes aspectos que deverão ser observados pela companhia no momento de elaboração de sua Política de Indicação, dentre os quais destaca-se a diretriz formulada no inciso IV, do art. 25, que veda indicação de: (i) representante de órgão regulados vinculado a Estatal, (ii) dirigentes de partidos políticos, e (iii) titulares do poder legislativo. Tal política reflete uma clara tentativa de mitigar o problema de agência que costuma afetar a gestão da empresa estatal.

Os últimos acontecimentos noticiados na mídia envolvendo indícios de corrupção praticados por dirigentes de empresas controladas pelo Estado, com reflexo direto no investimento público (Petrobras registra prejuízo de R$ 6,1 bilhões relacionados à corrupção), corroboram a necessidade de aprofundamento e aplicação rigorosa das diretrizes de governança corporativa vocacionadas à indicação do corpo diretivo; de modo que a escolha dos gestores reflitam os interesses da companhia em majorar seu valor de mercado e não um potencial projeto particular, tampouco partidário.